sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Desigualdade social e educação - Gazeta de Cuiabá, 02/10/2009

Gazeta de Cuiabá, 02/10/2009 - Cuiabá MT

Desigualdade social e educação

Juacy da Silva

Inúmeros estudos, ao longo de várias décadas, comprovam que o Brasil possui e convive com um dos maiores índices de desigualdade social e econômica do mundo. Isto é fruto de um processo de desenvolvimento concentrador de renda, riquezas e oportunidades nas mãos de uma minoria de um lado e a miséria, a pobreza e a exclusão social de uma imensa maioria de outro. A redução desses índices de desigualdade social e econômica, da mesma forma que as desigualdades de gênero, raça e setoriais tem acontecido de forma muito lenta. Os principais mecanismos que possibilitam a redução das desigualdades, na atualidade brasileira, são basicamente as políticas compensatórias e de transferência de renda dos governos federal, estaduais e municipais; a melhoria real do poder de compra e do valor do salário mínimo e a ampliação do mercado formal de trabalho.

Esses três mecanismos têm suas vantagens e também suas vulnerabilidades. Por exemplo, as políticas compensatórias e de transferência de renda direta podem ser alteradas com as mudanças de governos, partidos e coalizões políticas no exercício do poder. O aumento real do valor do salário mínimo também depende de decisões do governo federal e da correlação de forças políticas e na aceitação dessas mudanças pelo setor empresarial. A ampliação do mercado formal de trabalho também depende de decisões políticas e das forças de mercado, pressupondo- se altas taxas de crescimento econômico, estabilidade das políticas macroeconômicas e avanços nos direitos trabalhistas e previdenciário. Resta uma última poção mágica para romper as injustas estruturas sociais, políticas e econômicas possibilitando que milhões de brasileiros que vivem abaixo ou pouco acima da linha da pobreza consigam avançar significativamente na divisão do bolo da riqueza nacional, ao qual denominamos de PIB.

Esta poção mágica chama-se educação, porém uma educação de qualidade, universal e gratuita, vale dizer, uma educação que possibilite as camadas excluídas poderem se apropriar de instrumentos que lhes garantam uma melhor inserção no mercado de trabalho e na sociedade. Aí é que está o "X" da questão. A educação brasileira continua sendo objeto de muito discurso (falso) por parte dos donos do poder que também são os representantes das elites dominantes (elites políticas, econômicas e sociais). A massa trabalhadora, os pobres, os excluídos continuam recebendo uma educação de baixa qualidade e que não consegue atingir o patamar da universalizaçã o já conquistada pelas classes alta e média. Neste sentido, a educação que poderia ser um instrumento de transformação social também acaba assumindo o papel de um mecanismo de exclusão, reforçando as estruturas injustas da sociedade brasileira.

Dados da Clade, relativos a 2007, demonstram que o Brasil ocupa a 14ª posição entre 20 países quando a referência é taxa de analfabetismo. Nossa taxa é de 11,4% para pessoas com 15 anos e mais. Estamos em pior situação do que Aruba, Venezuela, Uruguai, Argentina, Costa Rica, Cuba, Colômbia, Equador, México, Paraguai, Barbados e outros mais na América Latina. Esses dados foram comprovados por relatórios recentes da Unicef e do IBGE. Em 2006 o número de analfabetos no Brasil (população com 15 anos e mais) era de 14,4 milhões de pessoas. Se adicionarmos a esses também os analfabetos funcionais (aquelas pessoas que apenas assinam o nome ou que escrevem e lêem umas poucas palavras) que representam mais de 25% da população dita escolarizada, este total seria de mais 31,5 milhões de pessoas. Ou seja, a soma de analfabetos e analfabetos funcionais atinge 45,9 milhões de brasileiros, inaptos para adentrarem um mercado de trabalho complexo e competitivo.

Esses dados são mais estarrecedores quando são desagregados por gênero, raça e regiões. Por exemplo, a população negra, parda e mulata no Brasil representa pouco mais da metade da população total. Todavia, 67,7% dos analfabetos são negros, pardos ou mulatos. Brancos ganham, em média, 40% mais do que os demais grupos, mesmo quando os níveis educacionais sejam próximos ou iguais. O acesso ao ensino superior também demonstra esse mecanismo excludente. Entre os brancos 56% chegam ao ensino superior e apenas 22% dos negros, pardos e mulatos conseguem tal façanha. Quando o assunto é conclusão do ensino superior a disparidade aumenta: 78% entre brancos, 3,3% entre os negros e 16,5% entre pardos e mulatos. Alguma coisa anda errada com a educação brasileira. De instância transformadora a mesma está sendo convertida em instância que reforça a exclusão social. Voltarei ao assunto oportunamente!

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