sábado, 15 de março de 2008

Professor UFOP apresenta experiência de alfabetização utilizando o Haicai

Professor da Ufop, Secretário Geral do InBrasCI-MG e Presidente da Comissão Editorial do Jornal Aldrava Cultural, Dr. J.B. Donadon-Leal, apresenta experiência de alfabetização utilizando o Haicai

Poesia japonesa ensina a viver

Polliane Torres


José Benedito Donadon-Leal diz que o Haicai ajuda no processo de aprendizado porque prima por uma construção textual simples

IPATINGA – As comemorações do Centenário da Imigração Japonesa, realizadas em Ipatinga, estão envolvendo vários segmentos da cidade, inclusive o da educação. Desde o início do mês, educadores da rede municipal estão recebendo orientações para levar aos estudantes o vasto universo cultural nipônico. Ontem esses profissionais tiveram um encontro especial com o professor José Benedito Donadon-Leal, da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), em seminário realizado no auditório da PMI. O professor de lingüística, poeta e ensaísta mostrou para aos participantes sua experiência de alfabetização utilizando como suporte o Haicai – um poema de origem japonesa, que chegou ao Brasil no início do século 20 e hoje conta com muitos praticantes e estudiosos brasileiros. O encontro integra a programação da 1ª Semana de Poesia e Literatura Infantil, que começou segunda-feira (10) e vai até domingo (16).

Movimento
Em entrevista ao DIÁRIO DO AÇO, o professor Donadon-Leal, que ministra aula para o curso de Letras da Ufop, falou do projeto desenvolvido por ele e outros escritores que integram o movimento literário Aldravismo. “Fazemos um trabalho de alfabetização externo, junto a escolas públicas de Mariana. Atuamos com professores de alfabetização apresentando o Haicai e dando subsídios teóricos para utilizar o material literário”, informou.

Donadon-Leal explicou que o Haicai auxilia os alunos aliarem o sentimento com a construção textual, durante a etapa de alfabetização. “O processo inicia-se da seguinte forma: a criança aprende a utilizar os sentidos e a tirar linguagem daquilo que ela vê, ouve, sente e cheira. Haicai é um poema sintético que apresenta alguma coisa que seja percebida em um instante. Se ela sente um cheiro diferente e precisa verbalizar isso a forma mais adequada de se fazer é usando a sintética, ou seja, transmitir aquela sensação de forma breve. Por meio do Haicai elas aprendem a verbalizar o sentimento”, explicou.

Livros
O seminário foi dividido em duas partes. Na primeira o professor apresentou aos educadores a história do Haicai no Brasil, nos últimos 90 anos. Donadon-Leal mostrou um pouco da produção dos japoneses imigrantes e da forma de os brasileiros fazerem Haicai ao longo do Século 20. “A primeira publicação de Haicai no Brasil foi em 1919, com Afrânio Peixoto”, ilustrou. Na segunda parte da palestra, o professor mostrou frutos do trabalho de alfabetização. São três livros produzidos por alunos de escolas públicas de Mariana, que cursavam a pré-escola, 1º e 4º ciclo de alfabetização. “A intenção é mostrar para professores que o trabalho dessa natureza dá resultado. Temos pelo menos 12 livros escritos”, contou.

Relação cultural
A dedicação do professor Donadon-Leal pelo Haicai começou muito cedo. Desde os sete anos de idade, conviveu com japoneses quando sua família se mudou para Maringá(PR). “Lá é uma região onde há muitos japoneses, então tive a felicidade de crescer com amigos japoneses. Eu ouvi Haicai em japonês desde a adolescência e fui me interessando pelo poema”, recordou.

Na opinião do lingüista, a comemoração do Centenário da Imigração Japonesa acontece em um período com grande fluxo de brasileiros emigrando para o país oriental. “O importante na relação cultural entre os povos é que sempre há o que aprender. Como a cultura japonesa é muito distinta da nossa, temos muito que aprender com eles e vice-versa. Hoje vivemos o sentido inverso em relação a 100 anos atrás. Temos muitos brasileiros indo para o Japão em busca de trabalho. Esse intercâmbio é um ganho muito grande para os dois países, e a imigração japonesa representa um dos maiores intercâmbios na história do Brasil, depois dos africanos no período da colonização”, ressaltou.

Cotidiano
Donadon-Leal acredita que essa troca cultural pode ser percebida no cotidiano. “É incrível como os japoneses têm-nos ajudado na visão de mundo. Percebe-se isso nas pequenas coisas. Hoje é comum encontrar Origamis sendo trabalhados nas escolas. Em 1998, por exemplo, o ensino nas escolas do Haicai foi incluído no PCN (Parâmetro Curricular Nacional) como um gênero literário. Isso é obrigatório no Japão e aqui esses parâmetros também sugerem que crianças brasileiras estudem Haicai na primeira fase da alfabetização”, destacou.

Simplicidade
O Hacai é composto de três versos, com cinco, sete e cinco sílabas, que geralmente têm como tema a natureza ou as estações do ano. Conforme Donadon-Leal, a simplicidade e o poder de síntese desse tipo de poesia ajuda a quebrar a idéia de que a língua portuguesa é muito difícil. “Todas as línguas são complexas. A língua portuguesa não é mais complexa do que as outras. O fator em nosso desfavor é que temos um déficit de alfabetização no país, e o Haicai ajuda a facilitar esse processo porque obriga a criança a trabalhar com metonímias, que é pegar uma minúcia de um conjunto”, concluiu o professor, que fez doutorado em Semiótica e Lingüística pela USP e pós-doutorado em Análise do Discurso pela UFMG.

O que é Aldravismo?

Aldravismo vem de aldrava, que é o utensílio com o qual se bate nas portas para que sejam abertas. Assim, o aldravismo caracteriza-se pela arte que chama atenção e está aberta para várias interpretações. O estilo trabalha com a idéia da arte sem começo ou fim. As manifestações artísticas são extraídas de um olhar subjetivo e por isso deve estar livre para interpretação.

O movimento aldravista começou no ano de 2000, com o lançamento do “Jornal Aldrava Cultural”, em Mariana, que delineava como objetivo a produção livre da arte, tendo como um dos difusores o professor Donadon-Leal. Esse tipo de arte prima pela experimentação de formas artísticas variadas, como sons, imagens, letras, sinais, figuras, matérias sólidas e vazios.

Polliane Torres

Se não conseguir visualizar, acesse:

http://www.diariodoaco.com.br/noticia.php?cdnoticia=7434

* Estas atividades são iniciativas do Instituto Brasileiro de Culturas Internacionais em Minas Gerais e da Associação Aldrava Letras e Artes.

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