domingo, 9 de março de 2008

Planeta, pobreza e democracia

Planeta, pobreza e democracia.

"A verdadeira democracia não tolera a existência de excluídos"
(Herbert de Souza, Betinho)

A fome, a miséria e a pobreza não são fatalidades humanas. Fazem parte de um projeto de sociedade que se move em torno da economia, da tecnologia, dos bens materiais, do capital, em detrimento do ser humano. Para a humanidade não entrar em colapso, é preciso re-fundar um projeto de sociedade humana colocando em seu centro o SER HUMANO.

Para o economista e prêmio Nobel da Paz, Muhammad Yunus, "a pobreza é a ausência de todos os direitos humanos". E se ela é um fator social, pode ser erradicada, bastando vontade e empenho por parte de cada ser humano que co-habita este planeta. Segundo Yunus, a miséria e a pobreza "foram criadas e são sustentadas por um sistema social e econômico que desenhamos para nós próprios; as instituições e conceitos que formam esse sistema; as políticas que seguimos". A discriminação, o acesso desigual aos recursos e o estigma social e cultural contribuem significativamente para a manutenção e ampliação das situações de miséria e fome no mundo.

Vendo esta triste realidade se agravar, o que fazemos? Muitos adotam posturas de piedade, tratando os excluídos como coitadinhos, despreparados ou com pouca sorte. Para estar de bem com sua consciência, vez por outra fazem campanhas e doações para repartir um pouco daquilo que lhes sobra. Outros exercem a caridade e compaixão. Suas atitudes geram compromissos para mudanças na realidade, exigindo de si mesmo e dos outros, novas posturas. Estes, que defendem as causas dos mais pobres e excluídos, incomodam e são combatidos, pois suas virtudes geram instabilidades naqueles que gostariam de deixar tudo como está. E os pobres, estes sim, vivem a solidariedade na prática cotidiana, como condição que lhes permite sobreviver, dividindo aquilo que têm entre si.

Já existem no Brasil políticas públicas que visam amenizar a fome e a miséria, como o Programa Fome Zero e o Bolsa-Família. Mas o limite destas políticas é que elas não mudam na estrutura a condição de pobreza. Os excluídos continuam pobres e estes continuam aumentando, numericamente. A vulnerabilidade social cresce a cada dia. É por isso que não há outro caminho a não ser a inclusão, permitindo que todos possam participar da sociedade, decidindo e beneficiando-se dos processos de produção e distribuição dos produtos e bens, e da renda.

O sociólogo brasileiro Josué de Castro alerta que "a geografia da fome" já não tem mais fronteiras. São necessárias medidas urgentes sob pena de um colapso global da humanidade e do próprio planeta. Vivemos, hoje, dois grandes problemas emblemáticos, historicamente construídos: a pobreza e a questão ambiental. "O grito da Terra" é também o grito dos pobres e oprimidos", alerta Leonardo Boff. Salvar o Planeta implica em erradicar a miséria e a pobreza, propiciando a todos os humanos os requisitos essenciais e indispensáveis para ser gente (comida, teto, água, cuidados, educação, cultura, trabalho, ...).

Ninguém precisa falar em nome dos excluídos. Estes, ao tomarem consciência de sua condição de pobreza e exclusão, devem assumir para si o papel de porta-vozes deles próprios. Mas é preciso que a gente devolva a eles a possibilidade de falar e de interagir na sociedade, garantindo-lhes condições e oportunidades. Falar significa emancipar-se, viver a cidadania, resgatar a condição de sujeito de pensamento e de ação. Para acontecer inclusão, é necessário que todos tenham condições de participar e decidir sobre os rumos da vida comunitária e da social.

Começando pela gente, estamos dispostos a escutar (para incluir e considerar) aqueles que excluímos? Ou continuaremos a exigir dos outros, sem lhes dar condições e oportunidades?

Nei Alberto Pies, professor e militante de direitos humanos

0 Comments: