sexta-feira, 30 de maio de 2008

Capital estrangeiro no ensino superior

Capital estrangeiro no ensino superior. Grau de investimento pode atrair R$ 3 bilhões

O grau de investimento concedido ao Brasil no fim de abril, indicador que demonstra haver riscos menores para a entrada de capital externo no País, pode trazer mais dinheiro e movimentar o ensino superior privado. Para especialistas, o setor deve receber até R$ 3 bilhões nos próximos dois anos. O cenário aparentemente positivo, no entanto, é visto com ressalvas por educadores que acreditam que investimentos externos, abertura de capital e formação de conglomerados fazem com que a educação seja vista como uma mercadoria e não como um direito. A reportagem é de Renata Cafardo e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 26-05-2008.

"Os que já investiram no Brasil têm mais dinheiro e ainda há outros grupos para investir", diz o consultor de ensino privado e presidente da Hoper Educacional, Ryon Braga. Para ele, o ensino superior privado poderia ser mais beneficiado pelo investment grade se um número maior de instituições já tivesse aberto o capital.

Isso porque grande parte das ações colocadas à venda, como as do Grupo Anhangüera Educacional, foram compradas por estrangeiros. "Ainda são poucos os grupos profissionalizados no País. Há muito mais dinheiro, mas não tem onde entrar", completa.

O processo de organização e transparência da gestão de instituições de ensino superior privado é crescente no Brasil, mas ainda caminha com lentidão, de acordo com especialistas. A maioria das universidades é controlada por famílias, com estruturas de custo pesadas e inchadas.

"Para fazer um investimento, o capital estrangeiro vê até se tem telha de amianto no banheiro", diz o presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), Hermes Figueiredo. Segundo ele, muitos negócios de compras de instituições não são efetivados porque, pela falta da transparência, o investidor não consegue estimar seus riscos.

O ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza também acredita que o grau de investimento pode trazer mais dinheiro para o ensino superior, desde que mais universidades se profissionalizem. "O capital externo não compra uma instituição quebrada, só grupos nacionais fazem isso porque conhecem bem o mercado", explica.

Recentemente, processos de fusões, aquisições e fechamento de instituições tornaram-se comuns a alunos no ensino superior privado brasileiro. Foi o início de uma resposta a um mercado cada vez mais concorrido e saturado. Só o Centro Universitário Anhangüera comprou 16 instituições, entre elas a Uniderp, de Mato Grosso do Sul, a Faculdade Fênix, em Bauru e, na capital, o Centro Universitário Ibero-Americano em São Paulo (Unibero).

No ano passado, esse foi o primeiro grupo a abrir seu capital e a procura por cotas da empresa superou em 12 vezes o esperado. Foram R$ 360 milhões na primeira oferta de ações e outros R$ 508 milhões no segundo processo, em 2008. Quase a totalidade foi comprada por investidores de fora do País. Depois da abertura de capital e das aquisições, o Grupo Anhangüera passou de 40 mil para 139 mil alunos.

Outros três grupos de ensino - Estácio de Sá, Pitágoras e COC - fizeram o mesmo em 2007. Há especulações no mercado de que a Universidade Paulista (Unip), a Véris Educacional (que controla o Ibmec e o IBTA) e a Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul) estejam se preparando para também lançar ações na bolsa.

"O investment grade provoca dois impactos: um na possibilidade de captação de recursos pelas instituições e outro no financiamento estudantil", diz Ricardo Scavazzo, sócio do Pátria Investimentos, cujo fundo comprou participações na Anhangüera e hoje é seu controlador. Para ele, o novo índice recebido pelo País vai também baixar as taxas de juros, o que beneficia empréstimos a estudantes para financiar seu curso superior.

NAS MÃOS DE ESTRANGEIROS

Apesar de terem vendido suas ações a grupos e fundos de fora do País, as universidades que abriram o capital não passaram a ser controladas por dinheiro estrangeiro. Isso porque só uma minoria das cotas foram colocadas no mercado e o restante continuou na mão dos mantedores. Já a Universidade Anhembi Morumbi vendeu 51% de seu controle à rede internacional de universidades Laureate Education, dos Estados Unidos. A instituição americana gastou cerca de R$ 60 milhões na aquisição, em 2005, e investiu um valor não revelado em obras e equipamentos.

O grupo controla faculdades em outros países e, segundo a vice-reitora da Anhembi, Elizabeth Guedes, o grau de investimento ajuda os brasileiros. "Isso coloca a Anhembi em igual condição com uma instituição da Laureate em Madri, por exemplo, porque antes se dizia que era mais seguro investir lá", explica.

Para a educadora da Universidade de Brasília (UnB) especialista em ensino superior Regina Vinhais, o processo atual é extremamente negativo para a educação brasileira. "O ensino se torna um bem de consumo e não um bem de direito e é vendido conforme o poder de compra da sociedade", afirma.

Segundo ela, universidades com capital aberto, por exemplo, oferecem cursos de acordo com as demandas do mercado. "Se é bom para a sociedade brasileira isso não importa, é o mercado que vai decidir o que é bom ou não ali."

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