sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Fé, Política e Sociedade do Bem-Viver

Fé, Política e Sociedade do Bem-Viver

A Coordenação nacional do Movimento Fé e Política, reunida em outubro na Paróquia Santos Mártires, Jardim Ângela, São Paulo, diocese de Campo Limpo, encaminhou a preparação do 8º Encontro Nacional de Fé e Política, a realizar-se em Embu das Artes, SP, dias 29 e 30 de outubro de 2011. Com as bênçãos de D. Luís Antônio Guedes, do vigário Pe. Jaime e de cerca 50 lideranças da paróquia e da diocese, definiu-se o tema geral: Em busca da sociedade do bem-viver: Sabedoria, Protagonismo e Política.


Espera-se a presença de cerca de 5 mil participantes vindos de todo Brasil. A Zona Sul de São Paulo, onde se situa a diocese de Campo Limpo, tem uma rica história de lutas, mobilização social e pastoral popular. Nos anos setenta, com a existência de grandes indústrias metalúrgicas, houve grandes mobilizações populares em torno do transporte público. Iniciou-se em 1976 o Movimento contra a Carestia e um Movimento dos Trabalhadores Desempregados. Em 1978 houve a eleição dos primeiros parlamentares populares em meio à discussão da Anistia e aos primeiros debates sobre a reformulação partidária, com a futura criação do Partido dos Trabalhadores.O assassinato do operário metalúrgico Santo Dias da Silva, da Pastoral Operária, em meio a uma greve, marca a região até hoje.

A partir dos anos setenta e oitenta, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), a partir do bispado de D. Paulo Evaristo Arns, o trabalho de formação ligado ao mundo do trabalho, à periferia e aos direitos humanos, com a leitura e ligação da Bíblia com a vida e a realidade, tornam-se referência na vida das comunidades, na organização dos bairros, na política e nos movimentos sociais.

Nos anos noventa e dois mil, a região tornou-se um dos lugares mais violentos do mundo, conhecida como Triângulo da Morte, com a violência policial, a existência de grupos de extermínio, quadrilhas e o tráfico de drogas. A Igreja levantou o tema através de celebrações, movimentos de comunidades, vigílias. Mais uma vez houve uma resposta como movimento e organização do povo. Surge o Fórum em Defesa da Vida, no objetivo não apenas de reivindicar , mas também de formular propostas e política públicas, com o envolvimento de municípios, Poder Judiciário. Ministério Público e outras instituições. Houve avanços e conquistas, com grande diminuição da violência na região, o surgimento de novos atores sociais, a construção de políticas públicas.

Hoje, coloca-se outro desafio central, numa diocese que tem entre 2,5 e 3 milhões de habitantes. A maior preocupação é a questão ambiental. “O que a Amazônia é para o mundo, a região da Guarapiranga é para São Paulo”, falou-se na reunião. Os principais mananciais de água que abastecem São Paulo estão na região. É preciso, pois sustentabilidade, ter um Plano Diretor com participação popular e uma lei específica de mananciais. A questão é como viver melhor hoje no todo da dimensão humana, em harmonia com a natureza.

Justificam-se mais que nunca, portanto, o local do 8º Encontro e o tema escolhidos. Como explicou Pedro Oliveira, da Coordenação Nacional do Movimento, a idéia do bem-viver vem da tradição milenar dos aimaras, quéchuas e guaranis. O ponto de partida dos povos andinos é o respeito à alteridade. Supera-se a idéia ocidental de que apenas a espécie humana é a pensante, portanto a existente e que o resto, animais, natureza, não são pensantes, portanto não existentes. Terra é mãe, Pachamama. Não se pode machucar a terra, mas sim precisa-se conviver com ela. Essa idéia está hoje na constituição boliviana e equatoriana. Na visão cristã, o Reino de Deus é para nós, humanos, não inclui a natureza. O capitalismo e o socialismo têm a mesma raiz produtivista. O bem-viver obriga a rever a visão racional ocidental e até o cristianismo. Propõe a harmonia entre pessoa e planeta. “Não somos o centro do mundo; somos parte.” Esta idéia do bem-viver implica envolver o que e como se produz, o que se faz, É uma alternativa à crise planetária econômica, ambiental. Evita a guerra pela água, por exemplo.

A sociedade do consumismo produtivista precisa ser repensada, porque não respeita o meio ambiente e o ser humano. Ou liquida com a natureza ou reduz o ser humano a máquina ou a comprador, sem trazer felicidade e bem-estar individual e coletivo. Saber viver é priorizar a vida, respeitar as diferenças, viver em complementaridade e equilíbrio com a natureza, defender a identidade dos povos, obter acordos consensuados, valorizar direitos cósmicos, saber comer, saber beber, saber dançar, saber trabalhar, saber se comunicar, trabalhar em reciprocidade, não roubar e não mentir, proteger as sementes, respeitar a mulher, recuperar recursos, exercer a soberania, aproveitar a água, escutar os anciãos, reincorporar a agricultura às comunidades, promover a união dos povos em uma grande família, viver bem e não melhor.

O 8º Encontro Nacional de Fé e Política coloca-se, portanto, na perspectiva de colocar em xeque o modelo econômico e o projeto de sociedade dominantes e seus valores fundantes. Quer refletir sobre a fé, como alimentar o futuro da humanidade, como se vincular a um novo projeto de sociedade, como educar as futuras gerações para o bem-viver.

O desafio está posto. Até o final de outubro de 2011, sob as bênção de Santo Dias, é hora de refletir sobre o tempo e suas urgências, de (re)abrir sonhos e utopias, de mais uma vez unir fé e política.

PS. Contatos e informações:
www.fepolitica.org.br
secretaria@fepolitica.org.br

Selvino Heck
Assessor Especial do Gabinete do Presidente da República
Da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política
Em onze de novembro de dois mil e dez

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