quinta-feira, 17 de março de 2011

De uma Escola Aberta - Nei Alberto Pies

De uma Escola Aberta

“Os protagonistas aparecem e se esvaecem para seguir vivendo, história atrás de história, em outros personagens, que lhes dão continuidade. Tecidos pelo fio do tempo, eles são o tempo que fala: são bocas do tempo” (Eduardo Galeano, em De pernas pro ar – A escola do mundo ao avesso, LPM)

Ainda existe uma Escola Aberta em nossa cidade. Uma escola aberta para uma prática pedagógica que promova, fundamentalmente, a inclusão através da apropriação do conhecimento, com interação social. E que tem por filosofia ser uma “escola questionadora e transformadora das práticas sociais, que garanta o exercício dos direitos da criança e do adolescente, oportunizando meios para a construção do conhecimento e exercício da cidadania”. Mas qual será mesmo a função social deste educandário? Quais razões justificam hoje a sua existência?

O surgimento da Escola Aberta, hoje Escola Estadual de Ensino Fundamental de Passo Fundo, remete a um determinado momento histórico. No ano de 1993, cria-se uma Comissão Interinstitucional composta pela Coordenadoria Regional de Educação, Fundação de Bem-estar do Menor, Secretaria Municipal de Educação, Sexta Coordenadoria Regional de Saúde, Juizado de Menores, Câmara de Vereadores e representantes de associações de bairros. Buscava-se, à época, construir uma escola e um currículo que tivesse por objetivos promover “os menores desassistidos pela escola regular” para “uma condição de se educar, ser respeitados, poder criar, escolher, decidir e sonhar”. Afirmava-se a intenção de não postular uma nova escola, mas recriar a própria escola numa dimensão social mais viva.

Desde então, com maior ou menor atenção e apoio dos gestores educacionais, a escola vem cumprindo, heroicamente, a missão de acolher e trabalhar com crianças e adolescentes que não tem encontrado suficiente acolhida e inclusão na escola regular, a maioria em descompasso de idade e escolaridade. Os educandos participam de aulas regulares, pela manhã, e oficinas, pela parte da tarde. “Para além da formação básica, as oficinas buscam incentivar e propiciar uma formação para o trabalho e a valorização da vida, permitindo também uma maior integração e vivência em grupo que leve os adolescentes a serem agentes de transformação junto à família e seu meio social mais amplo” (Doc. Proposta para estruturação e implantação, janeiro 1993)

Como em toda escola pública, a direção e o corpo docente da Escola Aberta vem lutando bravamente para manter as melhores condições do espaço físico, do trabalho pedagógico e do processo de ensino-aprendizagem. Mas a esta escola agrega-se uma função mais do que educativa: a dimensão da humanização, da convivência social, da construção dos sujeitos de direitos, da motivação para estudar. E para que possa exercer sua dimensão social, precisa ser tratada com mais prioridade. Precisa ter mais apoio, para um trabalho multidisciplinar. Precisa ser reconhecida pela sociedade por seu trabalho de acolhimento, educação, inclusão e cidadania. Precisa de um olhar diferenciado, que permita que se faça a diferença.

Estamos, hoje, em outro momento histórico. A Escola Aberta justifica-se hoje por ser um espaço educativo capaz de atender e entender um contingente de crianças e adolescentes que não tem sido compreendidos e entendidos em escolas regulares. Aqui, procura-se fazer uma fusão entre escola-arte-cultura-linguagem-cidadania-convivência-conhecimento. Passo Fundo, como outras cidades, precisa de um espaço educativo que desafie para uma formação integral do ser humano, a começar pelas nossas crianças e adolescentes mais vulneráveis. E atesta, para todos nós, que para humanizar a gente, só mesmo cuidando dos outros.

Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.

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