sábado, 22 de junho de 2013

EU ACUSO: OS OVOS DA SERPENTE!


O MPL, por conta de sua pluralidade, dajusteza da causa, de seu compromisso
com a transformação social no Brasil, sua ousadia e coragem, tem o apoio dos
movimentos sociais brasileiros, da população no geral.
Vale um brinde ao MPL pela histórica vitória da redução das tarifas (“Não são
só 20 centavos!”) de trens, metrôs e ônibus em muitas cidades no Brasil.
Na humildade, cabe registrar, muitos cidadãos e cidadãs, deram a cara à tapa por
essa causa e foram as ruas atrás desta conquista. Porém, não nos entorpeçamos e como
num embalo midiático do tipo “Pra Frente Brasil”, típico da ditadura militar, não
fiquemos reféns e cegos frente a um fato alarmante, que passo a acusar.
No meio da grande mobilização de massas um vírus, que precisa ser denunciado
publicamente, apareceu no meio do caminho, como o ovo da serpente de Bergman.
Se, dias desses, ao menos 77 jovens noruegueses reunidos num encontro foram
mortos por um homem armado movido por ódioao multiculturalismo na Europa e ao
marxismo, uma face visível do mesmo ódio apareceu nas ruas do Brasil, fato
mobilizado por forças sociais vivas e organizadas. Eu acuso: são fascistas e golpistas
contra o governo do Brasil.
O MPL, pelo que se sabe, nada tem a ver com isso, bom que se diga.
Vândalos, arruaceiros, baderneiros, dentreoutros xingamentos, ao longo de mais
de quinhentos anos de reprodução de uma das sociedades mais desiguais do planeta
Terra, são epítetos e palavras escolhidas a dedo pelas elitespolíticas no poder para gerar
medo e reprimir com violência a luta dos indígenas que aqui estavam havia cinco mil
anos ao menos, de negros e negras trazidos(as) escravizados(as) de África, de pobres
camponeses, moradores urbanos de vilas,  favelas, quebradas, mangues, morros,
subúrbios e baixas periferias Brasil afora. Esse tratamento da questão social aconteceu
em Palmares, em Canudos, na Revolta da Vacina, no Contestado, nas lutas contra as
ditaduras brasileiras, em Eldorado dos Carajás, nas aldeias do Mato Grosso do Sul.
Os manifestantes pela redução das tarifas não eram vândalos, como não o era a
jornalista da Folha de São Paulo atingida no olho por bala de borracha da polícia militar
paulista na rua da Consolação, também não era vândalo o fotógrafo da futura press
gravemente ferido no olho, nem o era o jornalista da TV Globo que levou um tiro na
testa ou o repórter da revista Carta Capital por portar vinagre em uma mochila.
Não eram vândalos nem os policias que trataram o povo nas manifestações como
tal. Isso era outra coisa. Eu acuso.
O vírus, o ovo da serpente, emergiu organizado do meio da massa, dos discursos
de setores midiáticos, de ações filmadas e gravadas ad infinitum, em tempos de grampos
eletrônicos globais.
Eu acuso a existência de espécies de personalidades jurídicas coletivas por trás
de rostos sorridentes que emitem opiniões como se fora individuaisnas redes sociais.
Eu acuso: aí está o fascismo, aí está o golpismo, feito vírus na rede mundial.
Neymar fez bela jogada e golaço contra o México. O hino nacional foi cantado
com imenso amor, a bandeira nacional tremulou, a rede mexicana balançou. Mas, a
cultura da alegria do povo brasileiro com o futebol está sob uma ameaça. Não se trata só
da sacanagem da FIFA, dos estádios erguidos com dinheiro necessário para áreas
prioritárias do social, como a saúde e a educação. O futebol visto na copa das
confederações nos envergonha enquanto nação, porque a alegria do povo é de repente
sequestrada em favor de um formato de arquitetura de destruição, que empurra o povo
como mero consumidor de cervejas, cartões de crédito, produtos esportivos etc. para
fora dos estádios, virados em novos clubespara as elites locais com ingressos
adquiridos a peso de ouro. Ao povo resta a TV ou o telão. A segregação social é nítida.
Eu acuso: a FIFA expõe um lado fascista.
Nas ruas do Brasil, o mesmo hino nacional e a bandeira nacional passaram a
serem apropriados por setores barulhentos como discurso uniforme a serviço de uma
identidade predatória e intolerante com o diferente. Se Hitler fez sucesso manipulando o
rádio e o cinema, as novidades tecnológicas da época, ao som do hino alemão, hoje, no
Brasil, forças políticas organizadas valem-se das redes sociais para levar às massas o
discurso de um neoverdeamarelismo claramente fascista e golpista, abusando da boa fé
popular. Isso eu também acuso.
Ao trocarem a crítica necessária e inadiável aos partidos e aos políticos do
Brasil, aos sindicatos etc. por uma nítidamobilização de um ódio aos partidos, aos
políticos, sindicatos etc., como numa noite onde todos os gatos são pardos, essas forças
sociais vivas na sociedade brasileira buscam atingir corações e mentes, ao estilo
hitlerista, para criar massas uniformes sob controle unitário. Isso eu vi e acuso.
Ao buscar mobilizar o ódio contra a cor vermelha de bandeiras e camisas de
variada gama de movimentos sociais buscam se esconderem covardemente atrás da
bandeira do Brasil, como distinção maniqueísta entre o bem e o mal. É a pulsação
fascista e golpista em franco curso noBrasil. Isso eu também vi e acuso.
Sem partidos políticos, goste-se ou não, não há democracia. Sem democracia é a
ditadura. A pregação contra os partidos estava como dogma nas ruas. Mas, no manual
de agitação e propaganda no meio da massa, outro ingrediente comum nos processos de
golpe militar no Brasil, particularmente no golpe contra o presidente eleito João Goulart
em 1964, também se viu nas ruas do Brasil: a violência artificiosamente articulada e
organizada. Eu acuso: isso também se viu em vários lugares do Brasil, como na
Avenida Paulista, no dia 20 de junho de 2013, e uma semana antes na Consolação com
a Maria Antonia, ambos em São Paulo.
Essa violência teve episódios por dentro da corporação policial, lugar onde não
se pode mais hoje descartar a hipótese da presença do vírus fascistae golpista como um
ovo de serpente.
Tem outros episódios na criação orquestrada em todo o Brasil de um clima de
caos, pânico e destruição das instituições estabelecidas da democracia brasileira
atingindo indistintamente variados partidos e níveis de governo. Foram atos
organizados. Eu acuso.
Por um lado, o ovo da serpente tem ares“doce e família”, quando sob a máscara
da bandeira e do hino do Brasil para ter simpatia das massas e trânsito entre elas. Por
outro lado se apresentam violentos, decididose contumazes no uso da força física, como
bons soldados da causa golpista e fascistasob um comando hierárquico definido, com
estratégia e tática. Eu acuso: isso está em curso no Brasil.
Assim como Hitler precisou de defuntos famosos para impor sua força pelo
medo, aqui, além da morte de um estudante jovem católico em Ribeirão Preto
atropelado por um carro, uma gari tambémmorreu vitimada por ataque cardíaco
causado por bombas de gás em frente à prefeitura de Belém do Pará. Mas o processo em
curso procura por defuntos famosos. Não à toa o Sr. Prefeito deSão Paulo e a Sra.
Presidente da República foram eleitos como os defuntos pretendidos para alimentar o
ódio no Brasil e impulsionar a vitória da causafascista e golpista. Isso eu acuso.
O ataque espetacular (para gerar espetáculo, ao gosto de Hitler na famosa
destruição do parlamento alemão de 1933) ao Itamaraty em 20 de junho de 2013 não
deixa dúvidas da intenção covarde contra o povo brasileiro, seus símbolos e valores
mais caros, como sua representação no concertodas nações. Isso é prova inconteste que
o nacionalismo é usado como mera fachada, porque quem de fato canta o hino e veste a
camisa do Brasil não destruiria o Itamaraty. Jamais. Isso eu acuso.
Importa aqui acusar que a cara desse novo fascismo e golpismo não é aquela do
homem de bigodinho nem dos militares de caserna de 1964. Se Hitler fez da crise do
capitalismo de 1929 o asfalto para sua estrada de poder e horror, agora, a crise
financeira mundial de 2008 quer colocar os Estados Nacionais e suas democracias em
xeque-mate, para serem capturadas sob o domínio ditatorial de um tecnocrata do
mercado financeiro globalizado, como se viu na Grécia falida e na Itália. Pode ser
também um engravatado de extrema direita sorridente que se recruta em qualquer canto
e se dá a devida maquiagem midiática. Isso eu também acuso.
Frente à crise econômica mundial, ao abaixar os juros no Brasil, Dilma Roussef
sofreu a ira das aves de rapina do mercado financeiro globalizado. Eu também acuso.
Como o Brasil não é a Islândia, as garras doscapitais sedentos por mercados passariam
a buscar colocar o Brasil na parede, com o governo assediado por tenebrosas transações
do mercado mundial de capitais, especulação financeira contra a moeda e a economia
diuturnamente. Dois casos escabrosos são oferecidos pelos mercados: a saúde como
grande mercado para fundos internacionaise a educação como outro grande mercado
para marcas internacionais. Uma overdose de fusões, aquisições e intensa concentração
de capitais, captação de políticos e formaçãode oligopólios gigantescos verticalizaram
esses setores, como ocorrera com a destruição da cadeia da indústria nacional de
alimentos nos anos dourados do neoliberalismo no Brasil dos anos 1990.
Ao atacar com palavras de baixo calãoas mulheres feministas da Marcha
Mundial de Mulheres, assim como a UNE, UBES, Levante Popular, PSOL, PSTU, PT e
Sindicatos de modo generalizado, a avenida paulista e o Brasil assistiram na prática a
aplicação da máxima hitlerista: estimule o ódio. Humilhe-os para provocá-los, dizia
Hitler sobre os comunistas, judeus, negros, homossexuais, ciganos, eslavos, chinos. É o
ovo da serpente espalhado nas ruas do Brasil. Eu acuso.
Deixar a política para os políticos profissionais e transformar a democracia
brasileira numa democracia só de procedimentos, como o voto a cada dois anos em
eleições, faz com que o sangue do povo brasileiro, seus sonhos e direitos sociais e
políticos corra num rio paralelo ao mundo dapolítica oficial de gabinetes, ternos e
gravatas. Tal sangue é sugado para alimentar a sede das forças fascistas e golpistas. Isso
eu também acuso.
Sem Reforma Política o Brasil para, porque todo mundo no Brasil já sabe que o
preço de certos políticos é muito barato, fácil os trinta dinheiros romanos os compram e
os põem como empregados de luxo para os mais vergonhosos apetites sobre o Brasil.
Como o povo, para muitos políticos é uma mera abstração, o povo abstrato é leiloado a
troco do dinheiro real do financiador da campanha em diante. Isso eu também acuso.
Por exemplo, as jogatinas políticas do setor de transportes nacionais tem um
rastro histórico de muitas mortes. É o caso urgente de se proibir empresas de transportes
de financiarem campanhas eleitorais para após a eleição serem proibidas de vir humilhar
o povo, aumentar as tarifas, tirar-lhes o suado dinheiro do bolso, o tempo, o conforto, a
dignidade humana. Isso eu também acuso.
É preciso desmentir o bordão “O povo acordou”, “O gigante acordou”. Isso por
respeito a milhões de homens e mulheres que construíram a democracia brasileira,
muitos deles trabalhadores que acordam muitas vezes às quatro da manhã para pegar
transporte e chegar na hora do serviço. O povo não estava dormindo. O povo brasileiro
sempre lutou! Sempre esteve acordado! Não somos vira-latas! Isso de bordões etéreos,
feito fogos de artifício soltos ao vento e que desconsideram a história e a dura realidade
das periferias brasileiras tambémé fascismo e golpismo. Eu acuso.
Ao ameaçarem um conjunto de jovensda periferia de São Paulo que
pacificamente carregavam uma faixa que denunciava o genocídio da juventude na
periferia de São Paulo, obrigando-os a enrolar a faixa, foi a intolerância que dormitava
que acordou. Ao queimarem um palco histórico do samba e da cultura negra no Rio de
Janeiro, os fascistas e golpistas expuseram sua cara racista. Isso eu acuso.
É que papai noel não existe. Nenhum direito social no Brasil caiu do céu, o povo
lutou sempre e teve inegáveis conquistas. Assumir um discurso das elites, que sempre
tacharam o povo brasileiro de preguiçoso, vagabundo etc., isso é culpar as vítimas.
As manifestações indicam inegáveis méritos, mas uma visão triunfalista e a-histórica choca o ovo da serpente e doura o enredo fascistae golpista em curso no
Brasil. Isso eu também acuso.
A empáfia de certos políticos brasileiros que olham o povo de cima para baixo
precisa ser denunciada. Ela transforma o povo brasileiro em números frios, gados
marcados eleitorais, estatísticas de marqueteiros, números em pesquisas qualitativas,
para a manipulação de especialistas de toda ordem, consultores e auditores de toda
ordem que servem de cortes políticas, manipulação de gigantescos bancos de dados.
Tudo isso substitui a interlocução direta com os movimentos sociais. Dessa fonte
tecnocrática também bebe o mar do golpismo e do fascismo. Isso eu também acuso.
Qualquer gerenciamento de pobres como método de governo também se
transmuta em um outro rio que achata a dimensão humana das pessoas no Brasil. Se o
gerenciamento da pobreza gera estatísticas e fluxos, não alimenta sonhos, mas castra o
sonho de uma plenitude cidadã que todo homem, toda mulher, livres por natureza, têm
direito. Dessa fonte também bebe o mar de golpismo e fascismo em curso no Brasil. Eu
também acuso.
Mas acima de tudo, o fascismo e o golpismo em curso no Brasil pode devorar a
democracia brasileira, hoje legitimamente constituída e duramente conquistada.
É preciso superar a desigualdade social no Brasil.
Se seu coração é vermelho, não o deixe arrancarem do peito, nem o deixe fazê-lo
parar de bater. A cultura da violência graça no Brasil nas vestes decavaleiros atrás da
aventura golpista e fascista. Ponha o sal nas mãos e como Gandhi convide as pessoas ao
seu redor para construir um presentede direitos sociais reais e paz.
Fascistas, Golpistas: Não Passarão! É preciso dizer isso publicamente, antes que
os ovos choquem!
Sérgio José Custódio, economista formado pela UNICAMP, presidente do MSU,
Movimento dos Sem Universidade.

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