sexta-feira, 20 de julho de 2007

Por que o tempo não envelhece?

Por que o tempo não envelhece?

Nei Alberto Pies, professor e militante de direitos humanos.

"Dizem sempre que o tempo muda as coisas, mas na realidade somos nós próprios quem tem de as mudar."
(Andy Warthol)

A experiência da semeadura permite a gente vivenciar uma relação diferenciada com a vida e com a terra. Esta experiência, mais constante nas trajetórias de vida pessoal e comunitária de muitos de nossos antepassados, permitia-lhes uma compreensão mais ampliada dos movimentos da vida e do tempo. A vida e o tempo, estes sempre teimam em nos ensinar. Semear é, para além de tudo, uma arte a ser novamente considerada e observada por aqueles e aquelas que buscam um maior sentido e compreensão de sua vida.

Semear tem um grande sentido pela esperança projetada nos frutos que pensamos colher. Mas, quem colherá? Eu ou os outros? Não importa. A mão do semeador é mão de quem lança esperança. Ele espera muito, mas o tempo da colheita e a qualidade dos frutos nem sempre são previsíveis. Os frutos, semelhante aos sonhos, são sempre projetados, na certeza que virão, na melhor medida. De certo, pensa o semeador, se não for eu, alguém vai colher, algum dia, nalgum lugar.

A arte de semear é arte de despojar. Exige preparar a terra com cuidado, respeito e dedicação e empenhar tudo, através das sementes, mesmo com muitas incertezas. O semeador faz sua parte, esperando a colaboração do tempo. O tempo, às vezes, transforma o semeador em sofredor. E oportuniza o exercício da paciência, espera e perseverança. Os resultados, por vezes, tardam e falham.

Muitos semeiam com o intuito de produzir alimentos, pensando na preservação da vida. Outros semeiam flores, porque cultivam o amor. Há também os que semeiam por semear. A diferença sempre está nos valores, nas motivações e nas crenças. A terra a tudo e a todos acolhe. Ela é a possibilidade de vida multiplicada. A terra não se pertence. Ela deixa-se ser possuída por aqueles que com ela fazem companhia.

Entre amar e semear haverá semelhanças? Sim, pois as incertezas do semeador, também as têm quem ousa amar. Os que amam e semeiam esperam muito, porque resolveram apostar, em farta colheita e em bons frutos. Amar é saber semear, sem querer dar às sementes lugares certos para frutificar. Quem colher, acolherá os frutos e os propósitos de quem um dia foi capaz de lançar, dividir, multiplicar. Semear e amar sempre são grandes apostas.

E o tempo? O tempo, que nos supera, é tempo que já se foi. O tempo que, o amanhã, está a nos despertar, para aquilo que ainda não foi, objeto de percepção.Tempo que corre ligeiro, quando a felicidade lhe toma o lugar. Tempo que se faz tempo na forma de circunstância, de hora e de lugar.

Mas não é o tempo quem nos autoriza a amar. Que bom que amar não requer marcar tempo, nem hora, muito menos, lugar. Que bom que o tempo é um leva e traz de coisas, de boas, também de ruins. Inda bem que felicidade, também feita de momentos, concretiza oportunidades de a vida desfrutar. E que encontros e abraços não tem tamanho e nem hora para acabar. E que viver em harmonia com Deus e com os semelhantes é o melhor que a vida pode nos oferecer.

Pois, todos semeamos alguma coisa sobre a terra. Nossas semeaduras diferem considerando o lugar que ocupamos e os valores e crenças nos quais acreditamos. E o tempo, este é feito de contra-tempos e ventos, que nos obrigam a buscar lugares seguros e férteis para semear. O tempo não é inimigo da vida, mas apenas, e tão somente, o seu definhar. Ele sempre é renovado pelas expectativas das semeaduras e das colheitas. Só assim compreendemos porque o tempo não envelhece. Ele tem a graça da renovação. E nós temos a possibilidade de semear.

Fonte:Centro de Filosofia
Educação para o Pensar

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