quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Entidades defendem mudanças no repasse de verbas da União a organizações da sociedade civil

Entidades defendem mudanças no repasse de verbas da União a organizações da sociedade civil

por Graciela Baroni Selaimen

Por Antonio Biondi e Marcel Gomes – Especial para a RETS

O Decreto 6.170, de 25 de julho de 2007, não resolve os problemas existentes no repasse de recursos da União por entidades da sociedade civil e pode inviabilizar trabalhos relevantes desenvolvidos pelas entidades mais sérias. A avaliação é de Tatiana Dahmer, integrante da diretoria nacional da Abong (Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais).

Segundo Tatiana, que é educadora na FASE, a Abong considera fundamental a adoção de novas regras que garantam maior transparência nos repasses e uso dos recursos. Tal regulação, contudo, precisa vir acompanhada de definições sobre a função das organizações no país hoje. Para ela, é preciso que o debate seja voltado “à aprovação de um novo marco legal para as organizações no Congresso Nacional”, conforme tem defendido a Abong, e “não dentro de um processo de criminalização das ONGs, sobretudo pela mídia”.

Na avaliação de Tatiana, pressionado por esse processo, o governo lançou mão de um decreto com “medidas moralizantes” e pouco efetivas, sobrepondo-se ao debate público que vinha sendo construído até então entre o próprio governo federal e as entidades.

Reação

A nova regulamentação traduzida no decreto veio em reação a cobranças de parlamentares e ministros do Tribunal de Contas da União. Escândalos de desvios de verbas envolvendo ONGs, como o esquema de superfaturamento do ambulâncias investigado pela CPI dos Sanguessugas, foram a base dessas cobranças, que desembocaram também na criação da CPI das ONGs no Senado, em março de 2007.

Segundo a Controladoria-Geral da União, que participou da elaboração do decreto, suas equipes estão a campo para investigar mais de 300 ONGs, entre elas as 20 maiores recebedoras de recursos nos últimos oito anos e aquelas que recebem recursos de emendas parlamentares.

No Senado, a CPI das ONGs ainda não foi instalada, mas, para a diretora da Abong, a elaboração e publicação do decreto estão “totalmente relacionadas” com a criação da CPI. “Agora, por problemas dos partidos e do Congresso, estamos pagando um preço muito caro”, afirma Tatiana, em alusão à crise de credibilidade que ronda essas instituições. Para ela, “as entidades realmente favorecidas pela impunidade não enfrentam fiscalização” e a corrupção não tem origem apenas nessas organizações.

A diretora da Abong ressalta que o escândalo deflagrado no final ano passado, quando o TCU apontou para a existência de um grande número de entidades com irregularidades nas contas, traz vários elementos importantes, muitos não publicizados pela mídia. “A maior parte das irregularidades decorria de problemas burocráticos, ou na prestação de contas”, afirma Tatiana. Ela explica que boa parte das dificuldades decorre da falta de estrutura das entidades, e, do outro lado do balcão, de mecanismos em que o Estado busca se eximir da execução de políticas públicas e colocar as ONGs realizando-as.

Expectativas

José Aldo dos Santos, coordenador-executivo da ASA (Articulação no Semi-Árido), afirma que a menor estrutura impede que as entidades estabeleçam o mesmo tipo de relação verificado entre instâncias do Estado. O decreto 6.170, vale lembrar, regulamenta também o repasse de recursos para Estados e municípios.

A exigência de realização do pregão eletrônico para a compra de produtos e contratação de serviços – adotada em 2005 pelo governo federal e temporariamente suspensa – é uma dos problemas centrais para as entidades. E, mesmo com o novo decreto, Santos explica que “não sabemos como será o processo de cotação de preços, e se enfim poderemos contratar funcionários em vez de precarizá-los em contratos temporários e consultorias, como exige hoje a legislação atual”.

“A Secretaria-Geral da Presidência tem nos consultado sobre as mudanças na legislação, mas uma coisa é ser ouvido, outra é ter suas idéias aceitas”, diz o coordenador da ASA. Segundo ele, “o governo nos disse que muita coisa será definida na regulamentação do decreto, então estamos na expectativa”.

Tatiana, diretora da Abong, compartilha com Santos a expectativa de que, a partir do diálogo entre entidades e governo, o decreto possa ser alterado, refletindo “uma postura mais conseqüente e respeitosa em relação às organizações e a seus trabalhos”.

Ao longo de dez dias, a reportagem buscou entrevistar o ministro Luiz Dulci, da Secretaria-Geral, a respeito das avaliações das entidades, mas uma resposta não foi obtida até o fechamento da matéria. Procurado pela reportagem desde a última segunda-feira (27), o Ministério do Planejamento também não respondeu aos pedidos de entrevista.

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